Use Elétrico conversou com o aventureiro durante sua passagem por São Paulo

O escocês Chris Ramsey nunca havia colocado seus pés na América do Sul até essa semana. E na próxima vez em que isso ocorrer, no ano que vem, ele estará ao volante de um SUV 100% elétrico, o Nissan Ariya, participando da primeira expedição totalmente elétrica ligando o Polo Norte ao Polo Sul.
Ramsey e sua esposa, além de mais um Ariya de apoio, percorrerão 27 mil quilômetros do Ártico à Antártida, cruzando as três Américas, enfrentando não só o desconhecido como temperaturas que deverão variar de 30 graus negativos a 30 graus positivos.
Um fato curioso é que nem ele nem a esposa são exatamente exploradores ou pilotos profissionais. A maior experiência do gênero do casal foi uma participação no chamado Rally da Mongólia, uma aventura estilo ‘cada um por si’ saindo de Londres e seguindo até a Rússia, quase fronteira com a Sibéria, em um trajeto de 16 mil km percorrido em 56 dias a bordo de um Nissan Leaf próprio.
Durante sua passagem por São Paulo, na terça-feira, 23, o simpático Chris conversou com a reportagem do Use Elétrico. Confira a seguir os principais trechos da entrevista.

Use Elétrico – Percorrer 27 mil quilômetros pelas três Américas, do Ártico à Antártida, em um carro elétrico. Tem certeza de que é uma boa ideia?
Chris Ramsey – [Risos] É sim. Claro que não acredito que será fácil, que não enfrentarei obstáculos. Mas é algo que está sendo planejado há quatro anos, não foi algo que tive a ideia agora e simplesmente estou saindo e pronto.
UE – A pergunta mais óbvia, e da qual não se pode fugir: você já sabe onde e como conseguirá carregar o carro por todo o trajeto?
CR – Dependerá do local. Alguns países pelo roteiro já têm uma estrutura de carregamento pronta, outros não. Mas quando alguém me diz que os carros a combustão são mais viáveis que os elétricos para longas viagens como esta porque há um posto de combustíveis em cada esquina, mas não um carregador, respondo que uma tomada é o suficiente. E aqui mesmo, nessa sala em que estamos conversando, há diversas. Só preciso de uma delas.
UE – Bem, mas no Ártico e na Antártida nem tomadas há…
CR – É verdade. Nunca um carro elétrico esteve em nenhum destes locais, será a primeira vez. Para essa situação estamos desenvolvendo geradores portáteis eólicos e solares, que nos darão a energia que necessitamos.

UE – O frio extremo dessas regiões não poderá afetar demais as baterias, reduzindo em muito a autonomia?
CR – São locais tão inóspitos que não conseguiremos andar mais do que 20 a 30 quilômetros por dia. A autonomia será a menor das preocupações. Mas vamos estudar, sim, o efeito das baixas temperaturas nas baterias, o que servirá de base inclusive de um estudo para eletrificar os veículos de pesquisa que trabalham nessas regiões.
UE – Você não é exatamente um piloto ou explorador profissional. Para uma viagem dessas isso representa uma vantagem ou uma desvantagem?
CR – Não, eu sou apenas um sujeito comum, entusiasta dos veículos elétricos que quer mostrar que eles são totalmente viáveis hoje. Eu tenho um Nissan Leaf desde 2013 e aos poucos fui aumentando as distâncias que percorria com ele, até que em 2017 participei do Rally da Mongólia, rodando 16 mil quilômetros de Londres a Ulan-Ude, na Rússia. Eu e minha esposa formamos a primeira equipe a participar e a completar este evento com um carro elétrico. O fato de não ser um rally oficial, de não haver vencedores, primeiro, segundo colocado etc., nos ajudou. Fizemos 111 cargas ao todo e conhecemos 111 histórias, lugares, pessoas. Pedimos tomadas emprestadas por muitas vezes e fomos sempre bem acolhidos. Foi uma experiência muito enriquecedora e que nos ensinou muito.

UE – Imagino que em muitos dos países que vocês atravessaram não havia qualquer estrutura para carregamento de elétricos. Está correto?
CR – Exato. Em vários deles nunca um carro elétrico havia sequer passado. Carregamos em casas, delegacias, concessionárias, batalhões de bombeiros, até direto de um transformador. Muitas vezes dormimos no carro. E sempre conseguimos carga suficiente para continuar nosso trajeto. E chegamos lá!
UE – Quais serão as modificações no carro?
CR – Queremos mexer o mínimo possível, assim como ocorreu com o Leaf do Rally da Mongólia. Teremos alterações para elevar um pouco a suspensão, de forma a encaixar pneus maiores, e uma proteção para a parte inferior do assoalho [peito de aço]. No mais, será o mesmo Ariya que qualquer pessoa encontra na concessionária.
UE – Uma pena que o roteiro não preveja passagem pelo Brasil, vez que a rota vai sempre beirando o Pacífico…
CR – Realmente, mas em uma expedição deste tamanho, desta magnitude, nunca se sabe o que se vai encontrar pela frente. Pode até acontecer de precisarmos fazer um desvio e passar pelo Brasil. Só saberemos mesmo quando estivermos no caminho.
