Exclusivo: provamos que o vídeo viral do 500e com bateria danificada é falso

Use Elétrico esmiuçou todas as informações relativas ao vídeo e mostra porque elas são mentirosas

Nas últimas semanas um vídeo muito curto, de apenas 22 segundos, se tornou viral no YouTube, Instagram e TikTok, tendo sido postado e repostado dezenas de vezes por diversos usuários destas redes sociais (assista acima). Ele mostra um Fiat 500e em um elevador de serviço, e um narrador não identificado diz que dois pequenos amassados na parte cental da tampa do assoalho do carro destruíram as baterias do veículo. O autor afirma ainda que o conserto custa R$ 240 mil.

Durante as duas últimas semanas a reportagem do Use Elétrico se debruçou longamente sobre este tema, e após colher muitas informações com dezenas de fontes envolvidas direta e indiretamente com o vídeo esmiuçou o caso, podendo afirmar seguramente que as informações nele mostradas são falsas.

Vamos explicitar, agora, ponto por ponto do vídeo.

O CONTEXTO: O vídeo foi gravado em agosto de 2022 em uma concessionária Fiat do Sul do país, onde o veículo em questão se encontrava para avaliação dos reparos necessários. Ocorria então ali um treinamento para oficinas tradicionais interessadas em trabalhar com veículos elétricos e híbridos, promovido em parceria por duas empresas especializadas. Como parte deste treinamento foi mostrado o carro no elevador, anunciado que suas baterias estavam danificadas e solicitado aos participantes presentes que observassem o veículo, antes de qualquer explicação, e tentassem entender a origem do problema, que seria detalhado, discutido e esclarecido depois. Foi nesse momento que então um dos participantes do treinamento fez o vídeo e, mais tarde, postou o material em redes sociais. Ou seja: no vídeo por ele gravado as afirmações são baseadas somente suas próprias conclusões pessoais, sem nenhum embasamento técnico ou orientação de qualquer profissional especializado. “A pessoa que gravou o vídeo não entende absolutamente nada de carros elétricos”, confidenciou à reportagem do Use Elétrico um dos sócios de uma das empresas que estavam promovendo o treinamento, que solicitou anonimato dadas as demais empresas parceiras envolvidas, que não quiseram se pronunciar.

O QUE REALMENTE ACONTECEU? De fato as baterias do 500e que está no vídeo foram inteiramente inutilizadas, mas não devido aos pequenos amassados nas laterais da parte central da cobertura mostrados na gravação. O que houve foi que o carro sofreu uma pancada violenta na parte frontal inferior, no lado do passageiro, possivelmente ao passar por uma lombada ou valeta em velocidade incompatível. Ainda que muito rapidamente, é possível ver no próprio vídeo que a parte inferior do para-choque, no lado do passageiro, está bastante dafinicada. Mostramos aqui o frame do vídeo em que é possível observar isso:

Parte inferior do para-choque do lado do passageiro danificada

Para demonstrar mais claramente como esta área sofreu a pancada inicialmente, mostramos abaixo dois 500e novos, idênticos ao modelo acidentado, para comparação, inclusive um na cor branca, onde se pode observar com maior contraste como é esta parte inferior do para-choque originalmente:

Detalhada a dinâmica inicial do acidente, descobre-se então que as tais “raspadinhas” no acabamento inferior mostradas no vídeo foram resultado da sequência da batida na dianteira, dado o movimento do veículo. Aqui, portanto, se nota claramente que a informação divulgada no vídeo, de que foram estas pequenas avarias no acabamento inferior as responsáveis por danificar as baterias, é falsa. O que acarretou o dano nas baterias foi a batida na parte inferior dianteira do 500e.

POR QUE ENTÃO TODO O CONJUNTO DE BATERIAS FOI DANIFICADO? O que ocorreu foi que a pancada na parte inferior dianteira rompeu a tubulação de arrefecimento interno das baterias, fazendo com que o fluido de refrigeração vazasse para dentro de todo o conjunto, o que causou a perda completa do sistema. Ou seja: as baterias em si não sofreram nenhum dano na pancada, mas elas foram atingidas pelo fluido de refrigeração e por isso foram inutilizadas.

Aqui pode caber eventual discussão sobre a fragilidade da tubulação do sistema de refrigeração das baterias (e até uma eventual correção ou aprimoramento desta parte do conjunto), mas estamos tratando aqui especificamente das informações divulgadas no vídeo, que não condizem com a realidade. Além disso o vídeo tenta induzir quem o assiste a acreditar que os carros elétricos são frágeis ou inadequados para as condições brasileiras, especialmente de asfalto, mas caso a mesma dinâmica do acidente tivesse ocorrido com um Fiat 500 (ou qualquer outro modelo) a combustão as consequências mecânicas para o veículo teriam sido igualmente severas.

O VALOR PARA TROCAR AS BATERIAS É DE R$ 240 MIL? Essa é outra informação falsa do vídeo. De acordo com fontes ouvidas pelo Use Elétrico que também solicitaram anonimato, a troca completa das baterias do Fiat 500e em questão custaria por volta de R$ 150 mil. É um valor alto, certamente, mas não é de R$ 240 mil, como dito no vídeo viral. Além disso cabe aqui outra ressalva: assim como ocorre com veículos a combustão, serviços realizados em concessionárias são mais caros do que os feitos em oficinas independentes. No caso dos carros elétricos não é diferente, ainda que exista atualmente, sim, menos mão de obra especializada fora das casas oficiais. Mas, também de acordo com fontes ouvidas pela reportagem, se o serviço de troca de baterias do 500e em questão fosse realizado externamente e aproveitasse um conjunto de baterias de outro carro eventualmente acidentado e cujo seguro tivesse indicado Perda Total, por exemplo, desde que as baterias estivessem intactas, o serviço poderia sair por cerca de R$ 50 mil.

QUEM ARCOU COM O PREJUÍZO? Diferentemente de inúmeros comentários postados nas redes sociais onde o vídeo circula, não houve prejuízo para um consumidor pessoa física no caso deste Fiat 500e com as baterias avariadas. Segundo apurou a reportagem do Use Elétrico o carro pertence a uma grande locadora de veículos, e o 500e, no momento do acidente, estava sendo conduzido por uma pessoa que o havia alugado em uma de suas lojas. Desta forma, uma eventual informação que acompanhe o vídeo indicando que uma pessoa física comprou o carro e teve que arcar com a totalidade dos prejuízos é igualmente falsa.

QUAL A POSIÇÃO OFICIAL DA FIAT? O Use Elétrico procurou a Fiat, por meio da assessoria de imprensa da Stellantis, montadora da qual a marca faz parte. Apesar de ser de todo interesse da fabricante, não houve por parte da empresa um grande empenho em esclarecer o caso. A Fiat somente enviou uma nota e não se prontificou a esclarecer alguns pontos que ainda geravam dúvidas durante a produção desta reportagem.

Leia a seguir a nota oficial da Stellantis sobre o caso enviada ao Use Elétrico:

“Com relação ao vídeo em questão, a Stellantis esclarece que, após análises mais técnicas, identificou-se uma avaria profunda na parte inferior do veículo decorrente de sinistro, e não apenas no acabamento inferior, como as imagens iniciais sugerem. Isso ocasionou, inclusive, a quebra da tubulação de arrefecimento e consequente vazamento interno do fluido para dentro da bateria, levando à inutilização da mesma. Importante ressaltar que o valor do kit da bateria está alinhado com o que se encontra no mercado de veículos eletrificados, o que o áudio do vídeo não esclarece e nem é correto. A Stellantis reforça ainda que todos os seus veículos passam pelos mais severos testes de qualidade e atendem todas as normas de homologação.”

Um comentário

Deixe um comentário

Preencha os seus dados abaixo ou clique em um ícone para log in:

Logo do WordPress.com

Você está comentando utilizando sua conta WordPress.com. Sair /  Alterar )

Imagem do Twitter

Você está comentando utilizando sua conta Twitter. Sair /  Alterar )

Foto do Facebook

Você está comentando utilizando sua conta Facebook. Sair /  Alterar )

Conectando a %s